Acessibilidade: uma cidade adaptada

Acompanhamos a rotina de deficientes físicos paulistanos para identificar o que ainda precisa ser alterado na capital – e os bons exemplos a seguir
por Elida Oliveira - 24/05/2010 - 18:36

Bruno Miranda
EU SOU GOLEIRO
João Lucas Dutra joga basquete com os amigos, Guilherme, Enzo e Murilo, no Colégio Dante Alighieri, onde também luta judô e pratica futebol, seu esporte favorito
João lucas dutra tem 9 anos e estuda em período integral. Goleiro do time de futebol de sua sala, o pequeno torcedor do São Paulo Futebol Clube é apaixonado por esportes. Ele também joga basquete e luta judô. Raquel Couto Amaral, de 27 anos, é empresária. No ano passado, ela e o namorado viajaram de bicicleta de São Paulo a Joinville, em um projeto educativo. Em maio, repetirão a dose, mas não o roteiro. Partirão de Pernambuco em direção a São Paulo, visitando escolas pelo caminho. Tábata Contri é uma atriz de 29 anos que também presta consultoria para empresas. Ela passa o dia na rua, indo de um lado a outro da cidade, entre testes de elenco, ensaios e visitas a clientes. Daniela Kovacs, de 30 anos, é assessora jurídica do Tribunal do Trabalho. Ela faz parte de uma comissão que desenvolve projetos para melhorar a qualidade dos serviços de atendimento ao público. João Lucas, Raquel, Tábata e Daniela estão entre os 4,5 milhões de deficientes físicos que vivem na cidade de São Paulo, segundo o IBGE.

Assim como todos os moradores da capital paulista, eles trabalham, estudam, fazem compras, namoram, vão ao cinema, ao teatro, a restaurantes, bibliotecas e bancos. A independência de que gozam, no entanto, exigiu a superação de uma série de obstáculos – típicos de uma cidade que não foi planejada para eles. “Evoluímos muito com a informação para a inclusão”, afirma Andrea Schwarz, de 33 anos, fundadora da consultoria i.Social e autora dos guias São Paulo Adaptada e Brasil para Todos. “Há 12 anos percebo melhoras significativas.”

Apenas 26% dos ônibus são adaptados e a frota de táxis
acessíveis é minúscula: são 35 em toda a cidade


TRANSPORTE PARA TODOS
Boa parte desse progresso foi impulsionada pela Lei no 8.213/91, a Lei de Cotas, que obriga empresas com mais de 100 funcionários a contratar pessoas com deficiência para uma parcela de seus cargos. Com a regulamentação e as multas impostas a partir de 2003 para fazer valer a lei, esse público começou a entrar em maior número para o mercado de trabalho – e a reivindicar uma cidade que lhes permitisse transitar livremente.

Apesar da evolução apontada por Andrea, ainda há muito a fazer para que São Paulo seja efetivamente uma cidade acessível, inclusiva, onde cadeirantes, deficientes visuais e auditivos possam contar com o sistema de transporte coletivo, circular por suas calçadas, estudar em qualquer escola ou escolher em que fileira do cinema preferem se sentar. Tábata, por exemplo, só consegue cumprir seus horários entre ensaios e reuniões com clientes porque circula de carro pela cidade. “Se dependesse de transporte público, não daria tempo, porque às vezes eu tenho de atravessar São Paulo de norte a sul, e os ônibus adaptados, dependendo da linha, demoram até duas horas para passar”, diz ela.

A cidade de São Paulo tem uma frota de 15 mil ônibus, dos quais apenas 3,9 mil (26%) estão adaptados para deficientes. O decreto 5.296/04, conhecido como Lei da Acessibilidade, estabelece que qualquer veículo do transporte público de uma cidade brasileira adquirido a partir de 2004 seja acessível. Como o tempo de vida útil dos ônibus chega a dez anos, a expectativa é que, até 2014, 100% dos ônibus paulistanos estejam adaptados. A prefeitura oferece um serviço de transporte porta a porta gratuito, o Atende, dirigido apenas a pessoas cadastradas e com alto grau de redução de mobilidade. Há ainda os táxis acessíveis, mas a frota é minúscula: são 35 em toda a cidade.

Adriano Almeida, de 31 anos, sabe bem a falta que um ônibus adaptado faz. Esse técnico em sistemas mora no Jardim São Luís, na Zona Sul, e leva mais de três horas para chegar à quadra da ONG Atitude Paradesportiva, perto do metrô Sumaré, onde joga basquete. Se as vans da Ponte Orca – que ligam o trem da CPTM à linha verde do metrô — tivessem estrutura para acomodar cadeirantes como ele, o tempo de deslocamento cairia pela metade. Mas os inconvenientes não terminam aí. As estações de metrô são parcialmente acessíveis. Na linha verde, por exemplo, somente uma das saídas é adaptada. Na Estação Ana Rosa, o elevador dá acesso a apenas uma das duas plataformas. Para alcançar a outra, a única opção é a escada. Também é comum que, nos fins de semana, os elevadores sejam desligados.

Bruno Miranda
VOCÊ É LINDA
Usando a Língua Brasileira de Sinais, Diego Ferrari Bruno faz um galanteio à namorada, Raquel Couto Amaral, enquanto passeiam de bicicleta no Parque Ibirapuera. Ela perdeu a audição aos 2 anos e fundou com Diego uma empresa que desenvolve projetos de comunicação voltados a deficientes auditivos
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